e, pensando bem, o berçário não era o melhor lugar.
Você de fraldas, uma graça, e eu pelado lado a lado,
cada um recém-chegado
você sem saber ouvir,
eu sem saber falar.
Visite: mensagens, papel de parede, filmes, videos
Tentei de novo, lembro bem, na escola.
Um PS no bilhete pedindo cola
interceptado pela professora como um gavião.
Fui parar na sala da diretora e depois na rua
enquanto você, compreensivelmente, ficou na sua.
A vida é curta, longa é a paixão.
Numa festinha, ah, nossas festinhas, disse tudo:
“Eu te adoro, te venero, na tua frente fico mudo”
E você não disse nada. E você não disse nada.
Só mais tarde, de ressaca, atinei.
Cheio de amor e cuba, me enganei
e disse tudo para uma almofada.
Gravei, em vinte árvores, quarenta corações.
O teu nome, o meu, flechas e palpitações:
No mal-me-quer, bem-me-quer, dizimei jardins.
Resultado: sou persona pouco grata
corrido a gritos de “Mata! Mata!”
por conservacionistas, ecólogos e afins.
Recorri, em desespero, ao gesto obsoleto:
“Se não me segurarem faço um soneto”
E não é que fiz, e até com boas rimas?
Você não leu, e nem sequer ficou sabendo.
Continuo inédito e por teu amor sofrendo
Mas fui premiado num concurso em Minas.
Comecei a escrever com pincel e piche
num muro branco, o asseio que se lixe,
todo o meu amor para a tua ciência.
Fui preso, aos socos, e fichado.
Dias e mais dias interrogado:
era PC, PC do B ou alguma dissidência?
Te escrevi com lágrimas , sangue, suor e mel
(você devia ver o estado do papel)
uma carta longa, linda e passional.
De resposta nem uma cartinha,
nem um cartão, nem uma linha!
Vá se confiar no Correio Nacional.
Com uma serenata, sim, uma serenata
como nos tempos da Cabocla Ingrata
me declararia, respeitando a métrica.
Ardor, tenor, a calçada enluarada…
havia tudo sob a tua sacada
menos tomada pra guitarra elétrica.
Decidi, então, botar a maior banca
no céu escrever com fumaça branca:
“Te amo, assinado..” e meu nome bem legível.
Já tinha avião, coragem, brevê
tudo para impressionar você
mas veio a crise, faltou o combustível.
Ontem você me emprestou seu ouvido
e na discoteca, em meio do alarido,
despejei meu coração.
Falei da devoção há anos entalada
e você disse “Eu não escuto nada”.
Curta é a vida, longa é a paixão.
Na velhice, num asilo, lado a lado
em meio a um silêncio abençoado
direi o que sinto, meu bem.
O meu único medo é que então
empinando a orelha com a mão
você me responda só: “Hein?”
Luis Fernando Verissimo